man on the moon
music will provide the light you cannot resist! ou o relato de quem vive uma nova luz na sua vida ao som de algumas das melhores bandas de rock alternativo do planeta!
The Smile – Cutouts
Cerca de oito meses depois do excelente registo Wall Of Eyes, o segundo álbum do trio formado por Thom Yorke e Jonny Greenwood, o chamado núcleo duro dos Radiohead e Tom Skinner, baterista do Sons of Kemet, os The Smile estão de regresso aos discos com Cutouts, um alinhamento de dez canções gravado em Oxford e nos estúdios Abbey Road no mesmo período em que foi incubado Wall Of Eyes. Produzido por Sam Petts-Davies, Cutouts conta com arranjos de cordas assinados pela London Contemporary Orchestra e tem a chancela, como é habitual nos discos dos The Smile, da XL Recordings.
Não é qualquer banda que chega ao terceiro registo de originais já com a fama de ser um projeto influenciador e fundamental do universo sonoro em que se movimenta. Como é óbvio, nos The Smile, essa justa chancela deve uma enorme quota parte de responsabilidade à fama que os seus músicos grangearam nos projetos de onde provêm, mas a bitola qualitativa das suas propostas sonoras, já agora, avançando um pouco para o conteúdo de Cutouts e o grau de abrangência e ecletismo das mesmas é, neste caso em concreto, uma verdade indesmentível.
De facto, ao terceiro disco os The Smile continuam a alargar e a enriquecer o espetro do seu catálogo, olhando, desta vez, com maior gula para a eletrónica do que nos dois discos anteriores, muito marcados pela preponderância da secção percussiva, alimentada pelo baixo e pela bateria. Logo a abrir o registo, a dupla Foreign Spies, tema que versa sobre a aparência de um mundo perfeito e a realidade perturbadora que se pode esconder por trás dele e Instant Spalms, oferece-nos a já habitual fina e vigorosa interseção entre o orgânico e o o sintético, de modo exemplarmente burilado, mas com a segunda esfera de influência a assumir a primazia, em duas composições que carregam uma intrincada e sinuosa espiral de arranjos que, na canção de abertura, nos faz planar rumo a uma cosmicidade plena de lisergia e que, no segundo tema, já nos oferece algumas nuances mais consentâneas com territórios que olham para as cordas como fonte importante na indução de detalhes enriquecedores e fundamentais. Este percurso por um trilho sónico que também tem um forte cunho experimental, repete-se um pouco adiante, em Don't Get Me Started, tema em que o dedilhar tranquilo de uma guitarra elétrica e o registo vocal ecoante de Thom Yorke, originam um travo intimista e contemplativo irrepreensíveis, nuances que não resvalam nem vacilam quando alguns detalhes percussivos, um teclado divagante e diversas sintetizações se insinuam e oferecem alguma rugosidade e corpo à canção.
Com Zero Sum o disco arranca para uma direção eminentemente imediata e rugosa, como é norma, aliás, nas melhores propostas do histórico dos The Smile, colocando o jazz como pedra de toque de uma canção que é uma sátira à confiança que todos depositamos na informática e no mundo virtual, enquanto nos oferece quase três minutos de rock frenético, com uma personalidade eminentemente orgânica. Guitarras abrasivas e um baixo corpulento são os ingredientes essenciais de uma canção com um elevado travo punk, receita que se repete, pouco depois, em The Slip, outra composição com uma personalidade mais orgânica, roqueira e vigorosa, com a bateria, o baixo, uma guitarra abrasiva e diversos entalhes sintéticos a incubarem, no seu todo, uma angulosa espiral cósmica hipnotizante, com um elevado travo progressivo e em Colours Fly, outro tema repleto de nuances, pormenores, sobreposições e encadeamentos, num resultado final indisfarçadamente labiríntico e que, mesmo não parecendo, guarda em si também algo de grandioso, comovente e catárquico.
Estilisticamente, as maiores novidades que Cutouts nos oferece, em campos absolutamente díspares, encontram-se em Eyes & Mouth, uma injeção de pura adrenalina soporífera jazzística, que pisca o olho à tropicália, com uma angulosidade nada disfarçada e em Tiptoe, uma espécie de névoa celestial, com o falsete etéreo de Yorke a olhar para o interior da nossa alma e a incitar os nossos desejos mais profundos, como se cavasse e alfinetasse um sentimento em nós, enquanto o piano amplifica ainda mais este inusitado momento de agitação elegante e introspetiva.
Disco que mescla com mestria rock alternativo e eletrónica ambiental, verdadeiras traves mestras no adorno e na indução de cor e alma a um catálogo de canções de forte cariz intimista e que apenas revelam todos os seus segredos se a sua audição for dedicada, Cutouts agrega nas suas dez composições mais um fabuloso conteúdo sonoro, lírico e conceptual, que disserta com gula sobre cinismo, ironia, sarcasmo, têmpera, doçura, agrura, sonhos e esperança, ao mesmo tempo que catapulta os The Smile para um processo de criação cada vez mais livre de qualquer amarra ou constrangimento comercial, sem dúvida o modus operandi que mais seduz três músicos mestres a encarnar aquilo que o experimentalismo tem por génese: a mistura de coisas existentes, para a descoberta de outras novas. Espero que aprecies a sugestão...
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Father John Misty – Screamland vs I Guess Time Just Makes Fools Of Us All
Dois anos depois do extraordinário registo Chloë And The Next 20th Century, Josh Tillman, que assina a sua música como Father John Misty, está de regresso aos discos ainda antes do ocaso de dois mil e vinte e quatro com Mahashmashana, o sexto disco da carreira do músico norte-americano, um álbum produzido pelo próprio Father John Misty e por Drew Erickson. São oito canções que vão ver a luz do dia a vinte e dois de novembro, com a chancela do consórcio Bella Union e Sub Pop Records.
Das oito composições que fazem parte do alinhamento de Mahashmashana, (महामशान) uma palavra em sânscrito que significa grande campo de cremação, já é possível escutar duas, os temas Screamland e I Guess Time Just Makes Fools Of Us All. São duas faustosas canções, com uma orquestralidade vigorosa e empolgante. A primeira, Screamland, tema que conta com a participação especial de Alan Sparhawk, dos Low, na guitarra e um extraordinário arranjo de cordas escrito por Drew Erickson, impressiona pelo clima algo sinistro e épico, dominado por cascatas de diversas distorções, eminentemente sintéticas. Já I Guess Time Just Makes Fools Of Us All, é uma canção vibrante, com um groove ímpar e uma sensualidade indesmentível, em que teclas, sopros e cordas se entrelaçam entre si, conduzidas por um registo percussivo frenético, com um grau de refinamento classicista incomensuravelmente belo.
Confere o vídeo de Screamland, assinado por Estefania Kröl, o vídeo de I Guess Time Just Makes Fools Of Us All e o artwork e a tracklist de Mahashmashana...
01 Mahashmashana
02 She Cleans Up
03 Josh Tillman and the Accidental Dose
04 Mental Health
05 Screamland
06 Being You
07 I Guess Time Just Makes Fools of Us All
08 Summer’s Gone
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The The – Some Days I Drink My Coffee By The Grave Of William Blake
Vinte e quatro anos depois de NakedSelf, o projeto The The, encabeçado por Matt Johnsson, está de regresso aos discos em dois mil e vinte e quatro com Ensoulment, um alinhamento de doze canções que irão ver a luz dia no final desta semana, com a chancela do consórcio Cinéola e earMUSIC.
Ensoulment foi escrito em Londres por Matt, que compôs as letras e criou o esboço de grande parte dos temas. O álbum foi depois burilado pelos restantes membros da banda, que afirmam que o disco entronca no adn dos The The, sem deixar de conter algumas nuances novas que vão ao encontro dos gostos musicais atuais dos membros do projeto. Tematicamente, o álbum tanto vai versar sobre a contemporaneidade política, o amor e as guerras em curso, como sobre alguns dilemas que hoje colocam em sobressalto o íntimo de Matt, colocando, desse modo, no centro da sua filosofia artística, a complexidade emocional da condição humana.
De Ensoulment já conferimos, no passado mês de maio, Cognitive Dissident, o tema que abre o disco. Cerca de seis semanas depois escutámos uma canção intitulada Linoleum Smooth To The Stockinged Foot, a nona do seu alinhamento, um tema escrito por Matt numa cama de hospital, sob efeito de morfina, enquanto recuperava de uma operação cirúrgica e que, sonoramente, contava com as participações especiais de Sonya Cullingford (violino), Terry Edwards (trompas), Gillian Glover (vozes) e Danny Cummings (percussão).
Agora, a poucos dias de Ensoulment ver a luz do dia, já podemos conferir Some Days I Drink My Coffee By The Grave Of William Blake, a segunda composição do alinhamento do álbum. Some Days I Drink My Coffee By The Grave Of William Blake começa por ser um nostálgico oásis de acusticidade intimista, que impressiona pelo clima jazzístico da percussão e por diversos entalhes metálicos. no entanto, o refrão oferece à canção o indispensável travo elétrico e rugoso com que está impregnado o adn dos The The, intocável há cerca de quatro décadas. Confere...
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Mercury Rev – A Bird Of No Address
Os Mercury Rev são, como todos sabemos, uma banda norte-americana de rock alternativo formada em mil novecentos e oitenta e quatro em Buffalo, nos arredores de Nova Iorque e já com um extenso catálogo discográfico em carteira que vai ter uma nova adição já em setembro. O nono e novo álbum da banda formada atualmente por Jonathan Donahue, Sean “Grasshopper” Mackowiak, Jeff Mercel, Carlos Anthony Molina,Dave Fridmann e Jason Miranda, chama-se Born Horses, chega aos escaparates no dia seis do próximo mês e o seu alinhamento de oito canções terá a chancela da Bella Union.
Já são conhecidos vários singles do alinhamento de Born Horses, todos disponíveis para audição nas plataformas digitais habituais, incluindo a página bandcamp dos Mercury Rev. O single revelado mais recentemente é A Bird Of No Adress, a quinta composição do alinhamento do registo. É uma composição com um perfil sonoro bastante dramático e emotivo, com as vozes, o piano e diversos arranjos sintéticos a conferirem a um perfil melódico planante e lisérgico, uma sensação de beleza e de espiritualidade únicos. Confere...
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The Smile – Don’t Get Me Started / The Slip
Cerca de sete meses depois do excelente registo Wall Of Eyes, o segundo álbum do trio formado por Thom Yorke e Jonny Greenwood, o chamado núcleo duro dos Radiohead e Tom Skinner, baterista do Sons of Kemet, os The Smile estão de regresso ao nosso radar devido a duas novas canções, Don’t Get Me Started e The Slip, que fazem parte de um vinil de doze polegadas, que ficará disponível em formato digital, para venda e para audição, no final desta semana.
O lançamento destes dois inéditos, que tem a chancela da XL Recordings, é algo surpreendente, mas tratam-se de duas canções que já tinham sido apresentadas em alguns concertos recentes dos The Smile e que terão sido incubadas durante o processo de gravação de Wall Of Eyes.
Don't Get Me Started é uma composição com um forte cunho jazzístico e experimental. O dedilhar tranquilo de uma guitarra elétrica e o registo vocal ecoante de Thom Yorke, conferem ao tema um travo intimista e contemplativo irrepreensíveis, nuances que não resvalam nem vacilam quando alguns detalhes percussivos, um teclado divagante e diversas sintetizações se insinuam e oferecem alguma rugosidade e corpo à canção. Já The Slip é uma composição com uma personalidade mais orgânica, roqueira e vigorosa, com a bateria, o baixo, uma guitarra abrasiva e diversos entalhes sintéticos a incubarem, no seu todo, uma angulosa espiral cósmica hipnotizante, com um elevado travo progressivo. Confere...
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The The – Cognitive Dissident
Vinte e quatro anos depois de NakedSelf, o projeto The The, encabeçado por Matt Johnsson, está de regresso aos discos em dois mil e vinte e quatro com Ensoulment, um alinhamento de doze canções que irão ver a luz dia a seis de setembro com chancela do consórcio Cinéola e earMUSIC.
Ensoulment foi escrito em Londres por Matt, que compôs as letras e criou o esboço de grande parte dos temas. O álbum foi depois burilado pelos restantes membros da banda, que afirmam que o disco entronca no adn dos The The, sem deixar de conter algumas nuances novas que vão ao encontro dos gostos musicais atuais dos membros do projeto. Tematicamente, o álbum tanto vai versar sobre a contemporaneidade política, o amor e as guerras em curso, como sobre alguns dilemas que hoje colocam em sobressalto o íntimo de Matt, colocando, desse modo, no centro da sua filosofia artística, a complexidade emocional da condição humana.
De Ensoulment já é possível escutar Cognitive Dissident, o tema que abre o disco. É uma canção poderosa e vibrante, um portento de punk rock progressivo com um curioso travo jazzístico e com um forte cariz experimental, conduzido por um baixo imponente e cavernoso, que vai sendo exemplarmente trespassado por diversas distorções abrasivas e subtis sintetizações, num resultado final que encarna uma fina e vigorosa interseção entre o melhor dos dois mundos, o do orgânico e o do sintético, fazendo-o de modo exemplarmente burilado. Confere Cognitive Dissident e a tracklist de Ensoulment...
Cognitive Dissident
Some Days I Drink My Coffee By The Grave Of William Blake
Zen & The Art Of Dating
Kissing The Ring Of POTUS
Life After Life
I Want To Wake Up With You
Down By The Frozen River
Risin’ Above The Need
Linoleum Smooth To The Stockinged Foot
Where Do We Go When We Die?
I Hope You Remember (the things I can’t forget)
A Rainy Day In May
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TOLEDO – Popped Heart EP
How It Ends foi o maravilhoso disco que a dupla nova iorquina TOLEDO, formada por Dan Alvarez e Jordan Dunn-Pilz, lançou em dois mil e vinte e dois, um registo que teve direito a uma reedição de luxo na primavera do ano passado e que, além do alinhamento original de doze músicas, continha mais alguns inéditos e demos de várias canções que faziam parte do álbum. A dupla ainda não anunciou um novo registo de originais dos TOLEDO em formato longa duração, mas está de volta com um EP de quatro canções intituado Popped Heart.
Em pouco mais de dezito minutos, os TOLEDO oferecem-nos em Popped Heart uma luminosa, efusiante e emotiva coleção de canções pop que, como In Yr Head (1818) tão bem demonstra, contêm um forte pendor eletrónico feito de sintetizações cósmicas e de uma batida vigorosa, nuances que sustentam cinco melodias felizes e cativantes, que vão sendo adornadas por diversos arranjos metálicos percussivos e pelo já habitual registo vocal da dupla, de elevado pendor etéreo, ecoante e adocicado.
Jesus Bathroom é outra curiosa canção deste EP, um tema com fortes reminiscências na melhor pop setentista e que reluz no modo como sobrevive e deslumbra através de sintetizações vibrantes e uma bateria e um baixo vigorosos, enquanto Lindo Lindo, uma composição com um perfil eminentemente jazzístico, aposta num groove e numa irreverência que Say! de certo modo mantém, mas através de um perfil mais etéreo e lo fi.
EP colorido, tocante e charmoso, Popped Heart contém, como seria de esperar, um forte pendor temperamental, enquanto recria, com minúcia e mestria, um ambiente muito peculiar, feito com cor, sonho e sensualidade, catapultando os TOLEDO para um patamar qualitativo sólido, inteligente e feito de um irrepreensível bom gosto. Espero que aprecies a sugestão...
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Man Man – Iguana
O texano Ryan Kattner, que já criou música com o pseudonimo Honus Honus, vive em Filadélfia e que também é mundialmente famoso por estar casado com a célebre atriz Constance Wu, é o líder do projeto sonoro Man Man, que já conta com vinte anos de carreira e que se prepara para regressar aos discos com um trabalho intitulado Carrot On Strings, um alinhamento de onze canções que vai suceder ao registo Dream Hunting In The Valley Of The In-Between, de dois mil e vinte e que irá ver a luz do dia a sete de junho, com a chancela da Sub Pop Records.
É nas asas de um curioso e labiríntico indie rock psicadélico experimental, de forte pendor setentista, que navega Iguana, o primeiro single divulgado do alinhamento de Carrot On Strings e a canção que abre o disco. Iguana inicia com uma hipnótica linha melódica abrasiva sintética, que começa por ser trespassada por uma batida seca encharcada com um groove irrepreensível e que nos obriga automaticamente a abanar a anca. Depois, com a ajuda das guitarras e de diversos sopros, Ryan enlea-nos com uma amálgama sinfónica recheada de elementos e detalhes que, do jazz ao eletro, nos instigam com uma vibe psicadélica incomum, mas prodigiosa, num resultado final que nos embarca numa viagem contundente rumo a uma indie lo fi e psicadélica, que nota-se claramente que foi cuidadosamente pleaneada e cuidada. Confere Iguana e o artwork e a tracklist de Carrot On Strings...
Iguana
Cryptoad
Tastes Like Metal
Mongolian Spot
Blooodungeon
Carrots On Strings
Mulholland Drive
Pack Your Bags
Alibi
Cherry Cowboy
Odyssey
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Elbow - Audio Vertigo
Dois anos depois de Flying Dream 1, os Elbow já têm nos escaparates Audio Vertigo, o décimo registo de originais do grupo formado por Guy Garvey, Craig Potter, Mark Potter e Pete Turner. O novo álbum da banda britânica viu recentemente a luz do dia com a chancela do consórcio Polydor / Geffen e, como não podia deixar de ser, é um notável e majestoso marco discográfico na carreira de uma das bandas fundamentais do cenário indie britânico deste milénio.
É bastante interessante a capacidade inventiva dos Elbow e a forma como conseguem, com uma regularidade ao alcance de poucos, apresentar novas propostas sonoras que apresentam, em simultâneo, uma saudável coerência que tipifica um ADN muito específico e um elevado grau de inedetismo, fugindo sempre, disco após disco, à redundância e à repetição de fórmulas, mesmo que bem sucedidas, como aconteceu quase sempre nas já quase três décadas de carreira do grupo.
Assim sendo, basta escutar-se uma única vez Audio Vertigo para se perceber que conceitos como epicidade, majestosidade e charme estão, como sempre, presentes, mas adornados, desta vez e com um curioso sabor a um certo hedonismo, por uma aposta ainda mais declarada no jazz, na pop sintetizada e em detalhes com berço africano e brasileiro, territórios sonoros que, sem fugir ao clássico rock, parecem ser, cada vez mais, algo de gula por parte de Garvey, que apresenta aqui os seus poemas mais negros e ironicos dos últimos tempos e de Craig Potter, o responsável maior pelo ideário instrumental dos discos deste grupo natural de Manchester.
De facto, logo em Things I’ve Been Telling Myself For Years, o trombone, a bateria seca, o coro gospel e o travo blues da guitarra dão à canção uma identidade jazzística indesmentível que, mais adiante, se amplifica para uma tonalidade algo psicadélica em Very Heaven, principalmente no modo como o baixo e a bateria se deixam enlear por uma guitarra eletrificada mas com um intenso perfil jam. Depois, em Her To The Earth, o teclado introdutório abre alas para uma batida com um groove bastante marcado por parte de uma bateria que se deixa enlear por um piano insolente, num resultado final pleno de sagacidade e altivez.
Pelo meio, o curioso travo oitocentista da explosiva e enérgica Balu, uma canção pop na verdadeira acepção da palavra, que oscila entre um refrão vigoroso e imponente e secções melódicas intermédias repletas de efeitos e detalhes, dos quais se destacam diversos instrumentos de sopro, num resultado final recheado de astúcia e virtuosismo, a intensa e vibrante Lover's Leap, composição instrumentalmente riquíssima feita de saxofones e trompetes faustosos e uma bateria e um baixo impulsivos e que até contém um curioso travo inicial latino e as intensas, progressivas e rugosas The Picture e Good Blood Mexico City, oferecem a Audio Vertigo aquela faceta roqueira intensa e vigorosa que foi também sempre imagem de marca dos Elbow, deixando para From The River todas as despesas no que concerne aquele perfil interpretativo mais reflexivo, etéreo e cósmico que também não é nada estranho à banda.
Em suma, depois de em dois mil e vinte e dois, em Flying Dream 1, este quarteto britânico nos ter oferecido um dos discos mais refinados, envolventes e íntimos da sua discografia, um verdadeiro deleite melódico, que brilhava canção após canção, no modo como nos ofereceu composições irrepreensíveis ao nível da beleza e do aconchego, em Audio Vertigo o quarteto solta as rédeas, deixa-se inspirar por alguns dos conceitos que vão definindo o melhor rock contemporâneo, sem perder identidade e de modo sedutor, adulto, certamente minuciosamente arquitetado e alvo de um trabalho de produção irrepreensível, criam um álbum que vai ser, claramente, um dos grandes marcos discográficos de dois mil e vinte e quatro. Espero que aprecies a sugestão...
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The Smile – Wall Of Eyes
Cerca de ano e meio depois de A Light For Attracting Attention, o disco de estreia do projeto The Smile que reúne Thom Yorke e Jonny Greenwood, o chamado núcleo duro dos Radiohead, com Tom Skinner, baterista do Sons of Kemet, a banda está de regresso com um novo álbum intitulado Wall Of Eyes, um alinhamento de oito canções que viu a luz do dia recentemente, com a chancela da XL Recordings.
Já em junho do ano passado tinha ficado a pairar no ar a ideia de que os The Smile teriam na forja um novo disco, quando divulgaram o single Bending Hectic, uma canção que fez parte do alinhamento apresentado pelo trio em alguns dos seus concertos de verão e que, contando com a participação irrepreensível de alguns membros da London Contemporary Orchestra, oferecia-nos, em pouco mais de oito minutos, uma fina e vigorosa interseção entre o melhor dos dois mundos, o do orgânico e o do sintético, de modo exemplarmente burilado. Essa suspeita inicial acabou por se confirmar, materializando-se num disco que agrega nas suas oito composições um fabuloso conteúdo sonoro, lírico e conceptual.
De facto, Wall Of Eyes capitaliza todos os atributos intepretativos do trio que assina os seus créditos e que, partindo dessa base, soube rodear-se de outros músicos que, em momentos chave do álbum, como é o caso do clarinete e do saxofone de Robert Stillman em Read The Room e Friend Of A Friend, ou da flauta de Pete Warehan em Teleharmonic e também em Read The Room, só para citar dois exemplos, foram preponderantes para acentuar um charmoso e contemporâneo ecletismo que materializa uma fina e vigorosa interseção entre o melhor de dois mundos, o do orgânico e o do sintético, de modo exemplarmente burilado, tendo, na sua génese, o jazz como pedra de toque e uma mescla entre rock alternativo e eletrónica ambiental como traves mestras no adorno e na indução de cor e alma a um catálogo de canções de forte cariz intimista e que apenas revelam todos os seus segredos se a sua audição for dedicada.
Logo a abrir o registo, o tema homónimo oferece-nos um portento de acusticidade intimista, sem colocar em causa a personalidade eminentemente rugosa e jazzística do projeto. Cordas dedilhadas com vigor, exemplarmente acompanhadas por um baixo pulsante, sustentam a voz enleante e profundamente enigmática de Yorke, enquanto diversos efeitos se vão entalhando na melodia, ampliando o efeito cinematográfico da mesma. É uma canção repleta de nuances, pormenores, sobreposições e encadeamentos, num resultado final indisfarçadamente labiríntico e que, mesmo não parecendo, guarda em si também algo de grandioso, comovente e catárquico. Depois, Teleharmonic parece querer imobilizar-nos definitivamente porque afunda-nos numa angulosa espiral cósmica hipnotizante, mas o travo progressivo de Read The Room, que paira no regaço de um carrocel psicadélico de sintetizações e distorções e efeitos, logo nos recorda novamente que estas são, acima de tudo, canções feitas para atiçar, inflamar zonas de conforto e deixar definhar apatias e desconsolos.
O disco prossegue e se a robótica guitarra que introduz Under Our Pillows nunca desarma no modo como nos inquieta, enquanto conduz uma abrasiva composição que em pouco mais de seis minutos nos inebria com um punk jazz rock de elevadíssimo calibre, já em Friend Of A Friend, os diversos entalhes sintéticos e alguns sopros, assim como o registo vocal ecoante de Yorke, dão asas a um tema que inicialmente cresce em arrojo e acalma repentinamente para, logo depois, numa espécie de jogo sonoro do toca e foge, deixar-nos, uma vez mais, irremediavelmente presos à escuta.
Até ao ocaso de Wall Of Eyes, a melancolia comovente de I Quit, o bucolismo etéreo e introspetivo de Bending Hectic que, curiosamente, fica ainda mais vincado e realista quando aos seis minutos explode numa majestosa espiral de imediatismo e de rugosidade labiríntica e a longínqua cândura do piano que se insinua em You Know Me!, rematam, com notável nível de destreza, bom gosto e requinte, a essência de Wall Of Eyes, um disco que disserta com gula sobre cinismo, ironia, sarcasmo, têmpera, doçura, agrura, sonhos e esperança, enquanto se torna num portento de indie rock do mais contemporâneo, atual e sofisticado que é possível escutar nos dias de hoje.
De facto, Wall Of Eyes é um álbum excitante e obrigatório, não só para todos os seguidores dos Radiohead, mas também para quem procura ser feliz à sombra do melhor indie rock atual, independentemente do seu espetro ou proveniência estilística. O alinhamento do registo contém uma atmosfera densa e pastosa, mas libertadora e esotérica, materializando a feliz junção de três músicos que acabaram por agregar, no seu processo de criação, o modus operandi que mais os seduz neste momento e que, em simultâneo, melhor marcou a sua carreira, quer nos Radiohead, quer nos Sons Of Kemet. É um disco experimentalista naquilo que o experimentalismo tem por génese: a mistura de coisas existentes, para a descoberta de outras novas. Espero que aprecies a sugestão...