man on the moon
music will provide the light you cannot resist! ou o relato de quem vive uma nova luz na sua vida ao som de algumas das melhores bandas de rock alternativo do planeta!
WHY? - The Well I Fell Into
Natural de Cincinnati, o norte-americano Yoni Wolf juntou-se, em dois mil e quatro, ao coletivo de hip hop Anticon, um dos mais estimulantes laboratórios de invenção de novos caminhos e recontextualizações de referências, formas e linguagens de genética hip hop. Passaram então a ser um trio, rebatizaram o projeto de cLOUDDEAD e juntos elevaram o hip hop delirante, neurótico e fragmentado ao estatuto de entidade essencial para a compreensão do século XXI.
Entretanto os cLOUDDEAD deram o berro, mas Yoni Wolf (aka WHY?) seguiu em frente e formou, com o seu nome artístico, uma nova banda com o seu irmão Josiah. Estrearam-se nos discos em dois mil e cinco com Elephant Eyelash, registo ao qual se seguiu Alopecia, em dois mil e oito, o glorioso expoente da união entre pop, hip hop e o experimentalismo, no fundo a bitola pela qual se rege a sonoridade deste projeto. Em dois mil e nove deram-nos Eskimo Snow, um álbum cheio de canções mais sombrias e nasaladas, com um tom provocador e afectado, uma receita milagrosa que se repetiu três anos depois com Mumps, Etc, treze canções repletas de humor negro e que mostravam uma estranha obsessão de Yoni pela morte, algo que o artista admitia, à época, com uma honestidade, quase desarmante, plasmar na escrita das suas canções.
Doze anos depois de Mumps, Etc, este projeto WHY? regressa ao nosso radar devido a um novo disco, um alinhamento de catorze canções intitulado The Well I Fell Into, que viu a luz do dia a dois de agosto com a chancela da Waterlines Label, etiqueta detida pela própria banda e que comprova a ascenção meritória deste projeto rumo a um patamar de excelência que merece amplo destaque, guindado por um disco que segue as permissas estilísticas acima discriminadas, que vivem essencialmente, como de certa forma foi descrito, de uma junção cuidada de diversos estilos e influências.
Explorando temas tão profundos como o sentimento de perca ou de auto descoberta, The Well I Fell Into é um mergulho sugestivo, impressivo e detalhisticamente rico e complexo, na mente de Yoni, um artista que chamou a estúdio, para gravar o álbum, um naipe de talentosos músicos e artistas, dos quais se destacam Gia Margaret, Macie Stewart, Lillie West, Serengeti, ou Ada Lea. O resultado final são pouco mais de quarenta e cinco minutos intensos e luminosos, mas também cheios de emoção e profundamente pensativos, nostálgicos e melancólicos.
Carregamos no play e em Marigold, a voz grave e nasalada de Yoni e o modo como se entrelaça com o piano e os violinos, oferece-nos uma espécie de receita milagrosa, na forma de um portento de indie pop que não descura, como também seria de esperar, uma aproximação angulosa à herança do melhor R&B contemporâneo, nomeadamente no registo percussivo. Depois, o clima intimista das cordas que acamam Brand New, amplia a sagacidade sonora do disco, ao mesmo tempo que testa a nossa capacidade de resistência à lágrima fácil.
Com início tão prometedor, é difícil abandonar a audição do disco, algo de que não nos arrependemos, logo a seguir, na arrebatadora G-dzillah G’dolah, uma extraordinária canção, que recria a história de alguém que viaja de avião ao encontro da amada que já não vê há algum tempo e que, sonoramente, tem como base um simples mas algo hipnótico trecho instrumental conferido por um piano que vai depois recebendo diversos adornos e interseções, que começam num violoncelo insinuante, que é depois abraçado por uma bateria de forte travo jazzístico e por violinos e outras sintetizações, num resultado final que recria uma melodia lindíssima e comovente, que quase nos leva às lágrimas. Depois, no meio de algumas incursões, mais ou menos escondidas, pelo dub e pelo jazz, a simplicidade cósmica de When We Do The Dance, as aproximações contundentes ao hip-hop nas asas das confessionais Jump e, principalmente, da épica Sin Imperial, a acusticidade solarenga de The Letters, Etc., o vigor sónico de Nis(s)an Dreams, Pt. 1, o rock simultaneamente emotivo e progressivo de Versa Go!, o delicioso travo blues e jazzístico de Sending Out A Pamphlet e o perfil psicadélico de Atreyu, escutamos uma representação feliz das diferentes colagens de experiências assumidas por Yoni ao longo da sua carreira e que parece ter sido alvo de uma espécie de súmula neste seu novo cardápio, um festim de canções pop exemplarmente polidas, picotadas e fragmentadas e que penetram profundamente no nosso subconsciente.
Após repetidas audições, The Well I Fell Into acaba por impregnar-se como uma lapa, porque nos oferece a inolvidável sensação de estarmos na presença de uma coleção de canções que poderiam ter sido idealizadas por uma criança que ganhou voz de adulto, aprimorou os seus dotes musicais, instrumentais, de escrita e melódicos, mas que, bem lá no fundo, nunca cresceu, nunca deixou de brincar com os instrumentos e assim conseguiu mais uma metáfora perfeita dos extremos desiquilíbrios em que vive o seu eu e o mundo em que ele vive, que é, como todos bem sabemos, também o nosso. Espero que aprecies a sugestão...
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Gorillaz – Cracker Island
Pouco mais de dois anos após Song Machine, Season One: Strange Timez, já está nos escaparates, com a chancela da Parlophone Records, Cracker Island, o oitavo álbum dos britânicos Gorillaz, projeto formado por Russell, Noodle, 2D e Murdoc e conduzido pelo enorme Damon Albarn, talvez a única personalidade da música alternativa contemporânea capaz de agregar nomes de proveniências e universos sonoros tão díspares e fazê-lo num único registo sonoro.
Cracker Island, impressiona desde logo pela vastíssima listagem de participações especiais, da qual constam nomes tão proeminentes como Stevie Nicks, Bad Bunny, Beck, Tame Impala, Bootie Brown, Adeleye Omotayo, um dos nomes maiores do projeto vocal Humanz Choir, um coro que teve um papel determinante no conteúdo de Humanz, o disco que os Gorillaz lançaram em dois mil e dezassete e outros artistas de relevo. Se tal não é de estranhar, por ser já um hábito neste projeto, nomeadamente em Plastic Beach, para a nossa redação o melhor trabalho da carreira dos Gorillaz, existe, no entanto, um ponto convergente, que é a opção por artistas que têm na pop, no seu formato eminentemente clássico, a sua zona de conforto, nomeadamente aquela pop que se cruza com o mais buliçoso R&B e que tem como origem o lado de lá do atlântico
E de facto, Cracker Island personifica um afastamento, talvez definitivo, dos Gorillaz daquele rock de matriz mais clássica, o rock que assenta em guitarras encharcadas em distorções, para uma guinagem em absoluto para territórios de cariz eminentemente sintético, ou seja, um modus operandi que, mantendo a experimentação como um conceito essencial, tem a eletrónica nos comandos, o hip-hop e o R&B na mira e o rock como apenas um apêndice, que pode servir para adornar detalhisticamente algumas canções.
Seja como for, uma das facetas mais curiosas das dez composições de Cracker Island é todas elas conseguirem atingir com enorme mestria o propósito simbiótico entre aquilo que é o som Gorillaz e o adn do convidado de cada tema. E esse é um dos grandes atributos do disco. A singela acusticidade minimalista e melancólica de Tormenta, o rap psicadélico de New Gold, como seria de esperar tendo em conta a presença dos Tame Impala e Bootie Brown, o transe retro de Oil, abrilhantado por beats inconfundíveis, a tonalidade pop do tema homónimo, a fusão entre dub e downtempo em Baby Queen, o travo urbano e caliente de Silent Running, aprimorado por um Adeleye Omotayo na sua melhor forma e o inesperado cruzamento entre jazz e soul em Possession Island, são os instantes maiores de toda uma caldeirada impressiva, mas tremendamente sagaz e contemporânea, que parece ter sido incubada com abertura de espírito, mas também, obedecendo à filosofia estilística de cada participante, sempre na busca de um tronco comum, que defina aquele que é, duas décadas após a estreia, o definitivo adn dos Gorillaz.
Cracker Island é, em suma, mais um intrigante exemplo sonoro de mescla de diferentes culturas, num pacote seguro e familiar, que permite a Albarn deixar mais uma vez vincada a sua apetência natural para se servir das raízes de qualquer estilo e conferir às mesmas o seu toque de personalidade, contornando, sem beliscar, todas as referências culturais dos seus convidados que, se não tivessem a mente tão aberta como o anfitrião, poderiam ver limitado o processo criativo. E assim, isentos de tais formalismos, não receiam misturar tudo aquilo que ouvem, aprendem e assimilam nas respetivas carreiras, fazendo-o com enorme bom gosto, ao mesmo tempo que refletem com indisfarçável temperamento sobre este mundo conturbado em que todos vivemos. Espero que aprecies a sugestão...
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Sons Of Kemet - Your Queen Is A Reptile
Your Queen Is a Reptile é o terceiro álbum do grupo britânico de jazz Sons of Kemet, um coletivo incubado em dois mil e onze e atualmente formado Shabaka Hutchings, Tom Skinner, Theon Cross e Eddie Hick. O grupo costuma servir-se do saxofone e do clarinete, instrumentos de sopro tocados por Hutchings, da tuba de Cross e de um exemplar trabalho de percurssão a cargo de Skinner e Hich para oferecer-nos um som que mistura o melhor do jazz, com alguns dos principais arquétipos do rock, da folk caribenha, do dub, da tropicalia e da música africana de cariz mais tradicional.
Your Queen Is A Reptile tira do anonimato contemporâneo personagens que tiveram os seus momentos de dor, mas também de glória e de reconhecimento, mesmo que póstumo e cujos ideais que defenderam acabam por ser ainda muito atuais, num mundo que continua a não saber respeitar a diferença e as minorias. Numa Inglaterra aristocrática, a viver o Brexit em pleno, com uma certa fobia relativamente aos imigrantes e onde a Monarquia sempre mostrou um posicionamento político algo conservador, este disco faz ainda mais sentido, sendo um exercício claramente recompensador pesquisar acerca destas mulheres constestatárias de sistemas vigentes quase sempre impostos à força e depois relacioná-las com a abordagem sonora que os Sons Of Kemet criaram para lhes dar vida, cor, ritmo e voz. Espero que aprecies a sugestão...
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Big Red Machine – Big Red Machine
Os mais atentos relativamente ao histórico recente do universo sonoro indie e alternativo recordam-se, certamente, da coletânea de beneficiência Dark Was The Night, lançada em dois mil e nove e cujos fundos revertiam a favor a Red Hot Organization, uma organização internacional dedicada à angariação de receitas e consciencialização para vírus HIV. Do alinhamento dessa coletânea fazia parte uma canção intitulada Big Red Machine, da autoria de Justin Vernon aka Bon Iver e Aaron Dessner, distinto membro dos The National, dois artistas que juntos também já desenvolveram a plataforma PEOPLE, que reúne composições inéditas de mais de oitenta artistas, organizaram festivais (Eaux Claires) e agora têm um projeto sonoro intitulado exatamente Big Red Machine, que acaba de se estrear nos discos com um extraordinário homónimo, abrigado pela já referida PEOPLE.
Produzido pelos próprios Justin Vernon e Aaron Dessner em colaboração com Brad Cook e com a participação especial de vários músicos que fazem parte do catálogo da PEOPLE, nomeadamente Phoebe Bridgers, This Is the Kit e músicos dos The Staves e que costumam tocar com os Arcade Fire, Big Red Machine coloca Vernon e Dessner na senda de sonoridades intimistas e ambientais, com composições de cariz predominantemente minimal mas que nem por isso deixam de ser intrincadas e de conterem várias nuances e detalhes que vale bem a pena destrinçar ao longo da audição das dez canções que compõem o registo.
Com a herança sonora de ambientes urbanos originários do outro lado do atlântico a ter sido certamente a grande força motriz da inspiração criativa da dupla e com uma filosofia soul sempre em ponto de mira, este é um disco com um universo sonoro fortemente cinematográfico e imersivo, um funk digital que nos leva numa viagem lisérgica por paisagens que, do dub ao R&B, passando pelo rap, o jazz, o afro beat e até o trip-hop, sobrevivem muito à custa de um cuidado arsenal instrumental, eminentemente eletrónico e, por isso, de forte cariz sintético.
Começamos a ouvir o registo e logo na batida de Deep Green, tema com forte cariz étnico e, ao mesmo tempo, uma ode inspirada à dita música negra e no modo como é feita a inserção de uma vasta miríade de efeitos e sons sintetizados em Gratitude, percebemos que este é um álbum complexo, onde é forte a dinâmica entre os diferentes elementos que esculpem as canções e que virá, daí em diante, mais um encadeamento de oito temas que nos obrigará a um exercício exigente de percepção, mas que será, de certeza, fortemente revelador e claramente recompensador, até porque tudo isto é ampliado, como todos sabemos, pelo claro charme e misticismo que estes dois músicos transportam sempre e que trespassa muitas vezes o cenário do que é apenas audível.
Assim, as inserções ritmícas que sustentam o funk incisivo de Lyla, na insanidade desconstrutiva em que alicerçam as camadas de sons das guitarras e do teclas que dão vida a Air Stryp, a espiral pop majestosa que exala do piano e da voz imponente de Vernon em Hymnostic e a incontestável beleza e coerência dos detalhes orgânicos e dos flashes sintetizados que nos fazem levitar em Forest Green, justificam, sem qualquer sombra de dúvida, a atribuição de um claro nível de excelência aos diferentes fragmentos que Vernon e Dessner convocaram nos vários universos sonoros que os rodeiam para este álbum, criando nele uma relação simbiótica bastante sedutora, enquanto partiram à descoberta de texturas sonoras que podem muito bem servir de referência para outros projetos futuros. Espero que aprecies a sugestão...
01. Deep Green
02. Gratitude
03. Lyla
04. Air Stryp
05. Hymnostic
06. Forest Green
07. OMDB
08. People Lullaby
09. I Won’t Run From It
10. Melt
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Elephant Micah – Genericana
Os norte-americanos Elephant Micah de Joe O'Connell, Matt O'Connell, Jason Evans Groth e Zeke Graves estão de regresso aos discos com Genericana, seis canções misturadas por Scott Hirsch e masterizadas por Carl Saff e capazes de nos enredar de modo particularmente hipnótico num universo que tendo tanto de alienigena como de alucinogénico. É um disco que comprova a já mítica mestria que este projeto oriundo da Carolina do Norte tem revelado ao longo da carreira para criar composições sonoras onde o salutar experimentalismo, que não renega o uso de nenhuma fonte sonora, é a principal filosofia prática no momento de compôr. Neste caso, um sintetizador barato, alguns artefactos da marca Hindustani e um antigo deck de três pistas, foram parte do arsenal utilizado para criar e captar toda a miríade de sonse ruídos que se escutam ao longo deste incrível alinhamento de seis canções.
Logo nos segundos iniciais de Genericana, um álbum com o artwork da autoria de Pete Schreiner, percebe-se que este disco é um poiso hermeticamente isolado do mundo real que conhecemos e que só é possível usufruir de tudo aquilo que ele tem para nos oferecer se nos deixarmos levar pela sua doutrina. Começa-se a escutar Surf A e percebe-se que ondas de ruído estático, loops de uma bateria eletrónica e alguns efeitos sintetizados muitas vezes impercetíveis são o ganha pão do arquétipo de um tema que acaba por nos apresentar com impressiva fidelidade o ambiente de um alinhamento que volta a repetir esta tríade, mas com outras nuances, em canções que contendo uma falsa sensação de minimalismo e atravessadas por uma guitarra que tanto pode estar eletrificada como ser dedilhada com elevada crueza, encarnam uma banda sonora que serve para os Elephant Micah refletirem e criticarem a realidade de uma América que culturalmente vive numa era em que vê a política a dominar e a condicionar cada vez mais, direta ou indiretamente o mundo do entretenimento.
Genericana tem este claro propósito de colocar em causa todos os estereótipos que parecem nos dias de hoje condicionar todos aqueles que criam musica no outro lado do atlântico. Para Joe O’Connell, o líder deste projeto, é necessário agitar as águas, remexer no que é efetivamente comercial e colocar os consumidores de música a refletirem se aquilo que escutam nos dias de hoje acrescenta ou não algo de importante e significativo às suas vidas. O disco serve também de crítica ao airplay que domina as rádios americanas e o modo como aquela que é a génese da música nativa tem sido abafada pelas recentes tendências da pop. Se Fire A homenageia a essência da country com que O'Connell cresceu e que o fez querer criar música, as distorções de Life A e o clima rugoso de Surf B, olham com particular saudosismo para o rock alternativo noventista, aquele rock que entre o grunge, o garage e outras nuances mais progressivas, mostrou a melhor forma do rock independente do lado de lá.
Em suma, prestando tributo aos melhores dias da música alternativa norte-americana de final do século passado, numa época onde a riqueza e a diversidade até deixaram que sonoridades mais dançantes, como o dub nova iorquino e o techno de Detroit, tivessem um espaço de relevo e de simbiose com o rock da altura (escute-se Fire B), Genericana é a tentativa dos Elephant Micah de criar um álbum que possa servir de ponto de partida para a música de um país que está, na óptica deste grupo, amorfa e demasiado amarrada à ditadura das playlists e das vendas, nomeadamente as digitais e que precisa urgentemente de se reinventar e de encontrar novos caminhos, criativamente mais ricos e salutares. Espero que aprecies asugestão.....
01. Surf A
02. Fire A
03. Life A
04. Life B
05. Fire B
06. Surf B
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Thievery Corporation – The Temple Of I And I
Sem um daqueles sucessos radiofónicos que catapultam um projeto para o éden durante um longo período de tempo, sem uma portentosa máquina de marketing por trás, vídeos com milhões de visualizações ou uma editora internacional nos seus créditos, os Thievery Corporation continuam, quase duas décadas após a estreia, a ser um dos nomes mais consensuais e influentes da chamada música de fusão, tendo uma base de seguidores fiel e numerosa em todo o mundo, a sua própria editora, a ESL Music Label, assento destacado em cartazes de alguns dos mais relevantes festivais de música e, mais importante que tudo isso, uma carreira recheada de extraordinários momentos sonoros. Assim, em 2017 os Thievery Corporation chegam ao seu oitavo disco de originais e embarcam em mais uma digressão que passa hoje por Portugal e que será certamente recheada de excelentes concertos, assentes não só neste novo disco, mas num extenso e eclético catálogo capaz de agradar a todos aqueles que se predisponham a dançar ao som desta dupla de Washington, formada por Rob Garza e Eric Hilton.
Se em 2014 os Thievery Corporation olharam profundamente para o Brasil no disco Saudade, agora em The Temple Of I And I, é a Jamaica que os seduz, com as quinze canções do registo a captarem muita da essência mítica e do poder da música deste arquipélago caribenho, resultado de uma prolongada estadia da dupla em 2015 numa das suas principais cidades, Port Antonio. Repleto de participações especiais das quais se destacam, por exemplo, os rappers Zee e Notch ou a norte americana Lou Lou Ghelichkhani, acaba por ser à boleia da jamaicana Raquel Jones, quer na contagiante Letter To The Editor, quer na interventiva Road Block, que melhor é absorvida e explanada toda a influência e exotismo deste pedaço de mundo onde nasceu, como todos sabemos, o reggae.
Estando, portanto, toda a herança sonora da Jamaica em ponto de mira para os Thievery Corporation neste The Temple Of I And I, esse mesmo reggae firma-se, naturalmente, como o grande suporte estilístico da sonoridade do seu alinhamento, com o dubb, o jazz, o rap e a eletrónica e fornecerem a base para arranjos, batidas, efeitos e até trechos melódicos, destacando-se, como grandes instantes do disco, o excelente baixo que conduz Strike The Root e True Sons Of Zion, a cadência algo inebriante e hipnótica do instrumental Let The Chalize Blaze e também do tema homónimo e as batidas de Babylon Falling. O objetivo primordial é que se mantém o de sempre; Fazer o ouvinte dançar mas também refletir sobre vários aspetos da vida contemporânea. nomeadamente os de cariz eminentemente político.
Já não restam dúvidas que Garza e Hilton apreciam imenso ir ao génese de alguns dos movimentos musicais essenciais da dita música do mundo, num disco onde, de acordo com os próprios, os Thievery Corporation dão vida à vocalização melancólica, quente e cheia de alma que faz parte da essência do reggae e completam um círculo onde, depois de deambularem pela música eletrónica e, no exato momento anterior a este registo, pela bossa nova, viajaram agora para algo ainda eminentemente orgânico, construindo mais um tronco do túnel do tempo musical que é a sua discografia, antes de passarem ao próximo capítulo. Espero que aprecies a sugestão...
01. Thief Rockers (Feat. Zee)
02. Letter To The Editor (Feat. Racquel Jones)
03. Strike The Root (Feat. Notch)
04. Ghetto Matrix (Feat. Mr. Lif)
05. True Sons of Zion (Feat. Notch)
06. The Temple of I And I
07. Time + Space (Feat. Lou Lou Ghelichkhani)
08. Love Has No Heart (Feat. Shana Halligan)
09. Lose To Find (Feat. Elin Melgarejo)
10. Let The Chalice Blaze
11. Weapons Of Distraction (Feat. Notch)
12. Road Block (Feat. Raquel Jones)
13. Fight To Survive (Feat. Mr. Lif)
14. Babylon Falling (Feat. Puma)
15. Drop Your Guns (Feat. Notch)
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Cloud Boat – Model Of You
Naturais de Londres, os britânicos Cloud Boat são Sam Ricketts e Tom Clarke, uma dupla de indie pop que lançou no passado dia catorze de julho Model Of You, através da Apollo Records. Este novo álbum dos Cloud Boat sucede a Book Of Hours, o trabalho de estreia dos Cloud Boat.
Quando eram mais novos, Tom e Sam tocaram em bandas de metal e de post rock e só mais tarde, no meio universitário, descobriram a eletrónica e o gosto por esse género musical foi-se acentuando à medida que, juntos, começaram a compôr. Começaram por editar em 2010, e através da etiqueta R&S, Lions On The Beach, um single que causou impacto pela mistura entre o dubstep e a folk, algures entre os Burial e os Hood e no ano seguinte dedicaram-se às remisturas. Finalmente, em 2013, surgiu Book Of Hours, o primeiro longa duração e, devido ao sucesso desse lançamento, Model Of You era aguardado pela crítica especializada com alguma expetativa.
Um sintetizador cheio de loops e efeitos e uma voz com um registo grave, mas ardente, que procura dar alguma cor e alegria às letras depressivas e assim espalhar sensualidade e hipnotismo às canções, são alguns dos trunfos usados pelos Cloud Boat, manuseados com evidente inspiração e que originam um ambiente sonoro cheio de charme, onde também não faltam algumas variações e os efeitos metálicos, que incluem cordas e instrumentos de sopro. Assim, Model Of You impressiona pela exuberância dos arranjos, apesar de não haver uma orientação explícita para as pistas de dança; No entanto, temas como Thoughts In Mine a Aurelia poderão agradar a quem procura essa vertente na música destes dois produtores britânicos.
O que se procura criar neste trabalho é, acima de tudo, paisagens sonoras amenas, mas cheias de movimento e cor, uma eletrónica com momentos mais ambientais, audíveis, por exemplo, em The Glow ou Golden Lights e outros onde há um apelo direto à típica indie pop de cariz mais comercial, com o piano de Hideaway ou as cordas de Bricks Are For a cumprirem cabalmente essa missão, ao memso tempo que nos permitem sermos invadidos por uma doce sensação de ternura e de melancolia. Os efeitos inebriantes que sustentam a percussão de Portraits Of Eyes, acompanhados por um loop de guitarra algo frenético, são outros trunfos de um disco mutante, que cria um universo quase obscuro em torno de si e que se vai transformando à medida que avançamos na sua audição, que surpreende a cada instante. Seja como for, o maior destaque deste disco será, talvez, Carmine, uma canção assente na tal voz grave, invasiva e visceral, a conferir um interessante colorido a um tema com uma toada eminentemente pop e com arranjos pensados para a criação de um ambiente épico e cheio de paisagens deslumbrantes.
O groove e a luminosidade deste registo são dois aspetos suficientemente apelativos para que não se deixe passar em claro uma coleção de doze canções intensas e bastante inspiradas que, passando pela chillwave e a eletrónica ambiental, impressionam pela atmosfera densa e pastosa mas libertadora e esotérica que transporta. Model Of You é um disco muito experimentalista naquilo que o experimentalismo tem por génese: a mistura de coisas existentes, para a descoberta de outras novas. Mas tem também uma estrutura sólida e uma harmonia constante. É estranho mas pode também não o ser. É a música no seu melhor. Espero que aprecies a sugestão...
01. Prelude
02. Hideaway
03. Carmine
04. Portraits Of Eyes
05. Bricks Are For
06. The Glow
07. Golden Lights
08. Aurelia
09. Thoughts In Mine
10. Told You
11. All Of My Years
12. Hallow