man on the moon
music will provide the light you cannot resist! ou o relato de quem vive uma nova luz na sua vida ao som de algumas das melhores bandas de rock alternativo do planeta!
SPRINTS - Letter To Self
Formados em dois mil e dezanove, os irlandeses SPRINTS de Karla Chubb (vocalista), Colm O’Reilly (guitarrista), Jack Callan (baterista) e Sam McCann (baixista), são uma das grandes sensações deste já vertiginoso início sonoro de dois mil e vinte e quatro. Sedeados em Dublin, apostam num indie rock incisivo, cru e imponente, à sombra de um catálogo interessante de influências que abraçam os cânones essenciais do grunge, do garage e do gótico, estilos que se cruzam e se mesclam sem receios nas suas criações sonoras, nomeadamente num alinhamento de onze canções intitulado Letter To Self, produzido por Daniel Fox e que viu a luz do dia por estes dias, com a chancela da City Slang.
Cada vez é mais difícil escutar um disco e sermos, no imediato, trespassados pelo seu conteúdo e tal suceder sem apelo nem agravo. Letter To Self é um forte, seco e contundente murro no estômago, um registo que nos recorda que a música ainda consegue surpreender e que ainda há esperança para quem já não acredita que é possível agitar as águas com algo de sustancialmente diferente do que o habitual e, melhor do que isso, inovador. Os SPRINTS não inventaram nenhuma fórmula nova, não descobriram a pólvora, como se costuma dizer, mas constate-se, em abono da verdade, que foram tremendamente eficazes no modo como sugaram para o seu âmago um leque de influências bem delineado e, dando-lhe um cunho pessoal que se transformou rapidamente em adn indistinto, criaram, logo na estreia, uma verdadeira obra-prima, porque é disso que Letter To Self se trata.
Logo a abrir o disco, na guitarra abrasiva e no modo como a bateria cresce em Ticking até à explosão eufórica rebarbada que é depois afagada pela voz de Karla, fica explícita a cartilha destes SPRINTS. Depois, em Heavy, com um ímpeto de imediatismo e de urgência indisfarçáveis e nos braços de uma melodia algo hipnótica e sombria, torna-se ainda mais óbvio o receituário que nos é aplicado, atingindo terrenos algo progressivos em Cathedrals, um festim punk que racha de alto a baixo qualquer convenção ou alicerce. Shaking Their Hands ainda tenta, sem sucesso felizmente, afagar um pouco a toada, através de um clima mais íntimo e clemente, mas o hino de estádio Can't Get Enough Of It, o travo psicadélico de Adore Adore Adore e, principalmente, o modo principesco como em A Wreck (A Mess) e Up And Comer o ruído torna-se sinónimo de coerência, enquanto estabelece uma relação íntima conosco que preenche, esclarecem-nos que este naipe de composições foi pensado para satisfazer até à exaustão a ânsia de todos aqueles que procuram projetos sonoros que fujam ao apelo radiofónico e que, simultaneamente, ofereçam ao rock novos fôlegos e heróis.
Neste disco ímpar, fabuloso, potente e visceral, o modus operandi é, portanto, coerente, claro, incisivo e explicito; Canção após canção é a guitarra que dá o mote, depois a bateria vai ao encontro dela, chocando os dois, muitas vezes, de frente e o baixo faz depois o trabalho sujo de contrabalançar e impôr ordem nessa luta satânica, mas que nunca se mostra desigual, entre cordas e baquetas. Em resultado disso, crueza, vigor, monumentalidade e destreza interpretativa andam sempre de mãos dadas, em quase quarenta minutos que se escutam, como tem que ser, com os punhos cerrados, o queixo altivo e as ancas desgovernadas. A energia e a vibração são constantes e enquanto isso sucede, exorcizamos demónios, enfrentamos os nossos medos e atiramos para trás das costas as nossas hesitações, gritando letras que falam das agruras típicas de quem entra na vida adulta e nem sempre sabe como lidar com os dilemas do amor, o peso da desilusão, as angústias do amanhã ou as marcas que o ontem nos deixou e que teimam em não passar.
Letter To Self é um disco que seduz, instiga e maravilha pela crueza e pela espontaneidade do rock que exala e que contendo aspetos identitários deslumbrantes de todo o espetro sonoro acima identificado, agrega-os com enorme mestria, ao mesmo tempo que define o adn de uma banda que vai ser, apostamos, referência e inspiração para outras. E quando esse patamar se atinge, um pódio ao alcance de poucos, mas que os SPRINTS já ocupam, estamos, obviamente, na presença de uma referência incontornável do indie rock atual. Espero que aprecies a sugestão...