man on the moon
music will provide the light you cannot resist! ou o relato de quem vive uma nova luz na sua vida ao som de algumas das melhores bandas de rock alternativo do planeta!
Os Melhores Discos de 2024 (10-01)
10 - Wand - Vertigo
Vertigo tem a assinatura de um dos projetos mais negligenciados do panorama sonoro alternativo atual, um belo segredo que não deveria estar tão escondido e que deve chegar a todos os ouvidos dos apreciadores do género sonoro em que navega. Parece claro que os seus quase quarenta minutos que foram incubados de modo a materializarem uma espécie de banda sonora ideal para um western contemporâneo que tem como propósito o bem comum e a sua audição com esse propósito, não irá defraudar as expetativas iniciais de todos, mesmo as mais otimistas. Momento mais alto do catálogo dos Wand, Vertigo é a ambiciosa materialização de um todo sonoro, porque as canções não devem ser apreciadas de modo estanque, nem desalinhadas da posição em que se encontram. Cada composição é uma parte metamórfica de um esplendoroso edifício sonoro, minuciosamente arquitetado para encarnar uma espécie de verdade científica que diz que a música dos Wand pode muito bem ser um atalho rapidíssimo para aceder a uma dimensão sonora que aconchega, anima e cura quem andar mais avesso relativamente ao que de bom a vida tem para nos oferecer.
9 - Foxing - Foxing
Foxing mantém o projeto na senda de uma sonoridade que consegue, em pouco mais de alguns segundos, passar do caótico e abrasivo, ao profundamente melancólico e planante, sempre com um travo tremendamente lisérgico, utilizando um processo criativo que tem tanto de inédito e pouco usual, como de profundamente atrativo e catártico. É, na sua génese, uma opção racional focada no uso coerente e intencional do ruido, direcionando-o para um propósito previamente delineado e que olha para o mesmo como uma virtude e uma porta aberta a inúmeras e bem sucedidas possibilidades criativas. De facto, o som dos Foxing incomoda a espaços, também embala em certos períodos, mas a verdade é que, de uma forma ou de outra, nunca deixa de ter em si algo de comovente e instintivamente magnético. Imponência e verticalidade na abordagem ao rock mais efusivo e um olhar anguloso a uma salutar epicidade, são também ideias que assaltam o ouvinte mais atento no final da audição de um disco que se assume como um catálogo obrigatório dentro das propostas mais contemporâneas que abordam aquele rock progressivo que tem feito escola no outro lado do atlântico nas últimas três décadas. E diga-se, em abono da verdade, que esta banda norte-americana assume-se, sem qualquer receio e com Foxing, como um projeto porta estandarte de um subgénero do rock que tem tido um airplay cada vez menor depois do período aúreo que viveu no dealbar do novo século, mas que ainda agrega, felizmente, uma legião fiel e devota de seguidores.
8 - WHY? - The Well I Fell Into
Explorando temas tão profundos como o sentimento de perca ou de auto descoberta, The Well I Fell Into é um mergulho sugestivo, impressivo e detalhisticamente rico e complexo, na mente de Yoni, um artista que chamou a estúdio, para gravar o álbum, um naipe de talentosos músicos e artistas, dos quais se destacam Gia Margaret, Macie Stewart, Lillie West, Serengeti, ou Ada Lea. O resultado final são pouco mais de quarenta e cinco minutos intensos e luminosos, mas também cheios de emoção e profundamente pensativos, nostálgicos e melancólicos. Após repetidas audições, The Well I Fell Into acaba por impregnar-se como uma lapa, porque nos oferece a inolvidável sensação de estarmos na presença de uma coleção de canções que poderiam ter sido idealizadas por uma criança que ganhou voz de adulto, aprimorou os seus dotes musicais, instrumentais, de escrita e melódicos, mas que, bem lá no fundo, nunca cresceu, nunca deixou de brincar com os instrumentos e assim conseguiu mais uma metáfora perfeita dos extremos desiquilíbrios em que vive o seu eu e o mundo em que ele vive, que é, como todos bem sabemos, também o nosso.
Romance amplia o percurso ambicioso e eclético do projeto, que no trabalho mais ambicioso e complexo da carreira materializa uma bem sucedida fusão de géneros, que oscilam entre o rock alternativo noventista, o rock progressivo, o hip-hop e aquela eletrónica que aposta em texturas eminentemente densas e pastosas. O punk rock, uma das imagens de marca do período inicial da carreira dos Fontaines D.C., não é colocado inteiramente de lado em Romance, mas tem um perfil mais marginal, servindo essencialmente como adorno em algumas canções. Numa época do vale tudo, custe o que custar e seja contra quem for e em que a individualidade se deixa facilmente manietar, quase sem se aperceber, pelas solicitações dos media e das redes sociais, Romance puxa pelo nosso lado mais emocional e sensível e faz com que nunca nos esqueçamos que o amor, a solidariedade e a compaixão pelo próximo fazem parte da natureza humana. Ao fazê-lo, comprova também que os Fontaines D.C. não são, nem devem ser, mais vistos como um cometa que passa, brilha no momento e que depois corre o risco de ser esquecido no ocaso do tempo e do espaço negro e profundo, mas que são, já e com pleno direito, uma das melhores bandas do rock alternativo mundial contemporâneo.
É bastante interessante a capacidade inventiva dos Elbow e a forma como conseguem, com uma regularidade ao alcance de poucos, apresentar novas propostas sonoras que apresentam, em simultâneo, uma saudável coerência que tipifica um ADN muito específico e um elevado grau de inedetismo, fugindo sempre, disco após disco, à redundância e à repetição de fórmulas, mesmo que bem sucedidas, como aconteceu quase sempre nas já quase três décadas de carreira do grupo. Assim sendo, basta escutar-se uma única vez Audio Vertigo para se perceber que conceitos como epicidade, majestosidade e charme estão, como sempre, presentes, mas adornados, desta vez e com um curioso sabor a um certo hedonismo, por uma aposta ainda mais declarada no jazz, na pop sintetizada e em detalhes com berço africano e brasileiro, territórios sonoros que, sem fugir ao clássico rock, parecem ser, cada vez mais, algo de gula por parte de Garvey, que apresenta aqui os seus poemas mais negros e ironicos dos últimos tempos e de Craig Potter, o responsável maior pelo ideário instrumental dos discos deste grupo natural de Manchester. Em Audio Vertigo o quarteto solta as rédeas, deixa-se inspirar por alguns dos conceitos que vão definindo o melhor rock contemporâneo, sem perder identidade e de modo sedutor, adulto, certamente minuciosamente arquitetado e alvo de um trabalho de produção irrepreensível, criam um dos grandes marcos discográficos de dois mil e vinte e quatro.
5 - DIIV - Frog In Boiling Water
Frog In Boiling Water oferece aos DIIV uma apreciável guinada conceptual, já que os coloca na senda daquele rock com elevado travo shoegaze, feito de cordas sujas e tremendamente abrasivas, acamadas por um baixo imponente, mas discreto. A voz de Zachary sempre ecoante e um registo percussivo geralmente arrastado e simultaneamente hipnótico, são outros atributos transversais a todo o registo, com os sintetizadores a conferirem a toda a trama os indispensáveis adornos, além de ajudarem as canções a terem a alma e a filosofia desejadas. É um disco homogéneo e em que sombra, rugosidade e monumentalidade se misturam entre si com intensidade e requinte superiores, através da crueza orgânica das guitarras, repletas de efeitos e distorções inebriantes e de um salutar experimentalismo percurssivo em que baixo e bateria atingem, juntos, um patamar interpretativo particularmente turtuoso, enquanto todos juntos obedecem à vontade de Zachary de se expôr, uma vez mais, sem receios e assim afugentar definitivamente todos os fantasmas interiores que o vão consumindo e que carecem constantemente de exorcização. Frog In Boiling Water é, em suma, um incondicional atestado de segurança, de vigor e de superior capacidade criativa dos DIIV, que conceberam um lugar mágico que, mesmo sendo abastadamente ruidoso e sonoramente atiçador, não deixa de conter um toque de lustro de forte pendor introspetivo e que nos provoca um saudável torpor, devido à sua atmosfera densa e pastosa, mas também libertadora e esotérica. Acaba por ser um compêndio de canções que não nos deixa iguais e indiferentes após a sua audição, desde que dedicada, também por causa do seu perfil intenso e catalisador.
Cada vez é mais difícil escutar um disco e sermos, no imediato, trespassados pelo seu conteúdo e tal suceder sem apelo nem agravo. Letter To Self é um forte, seco e contundente murro no estômago, um registo que nos recorda que a música ainda consegue surpreender e que ainda há esperança para quem já não acredita que é possível agitar as águas com algo de sustancialmente diferente do que o habitual e, melhor do que isso, inovador. Os SPRINTS não inventaram nenhuma fórmula nova, não descobriram a pólvora, como se costuma dizer, mas constate-se, em abono da verdade, que foram tremendamente eficazes no modo como sugaram para o seu âmago um leque de influências bem delineado e, dando-lhe um cunho pessoal que se transformou rapidamente em adn indistinto, criaram, logo na estreia, uma verdadeira obra-prima, porque é disso que Letter To Self se trata. Letter To Self é um disco que seduz, instiga e maravilha pela crueza e pela espontaneidade do rock que exala e que contendo aspetos identitários deslumbrantes de todo o espetro sonoro acima identificado, agrega-os com enorme mestria, ao mesmo tempo que define o adn de uma banda que vai ser, apostamos, referência e inspiração para outras. E quando esse patamar se atinge, um pódio ao alcance de poucos, mas que os SPRINTS já ocupam, estamos, obviamente, na presença de uma referência incontornável do indie rock atual.
3 - Nick Cave & The Bad Seeds - Wild God
Wild God parece-nos ser o veículo que Cave utiliza para dar a volta por cima, porque é um disco que nos ajuda, sem qualquer dúvida, a sentir novamente paixão pela vida, dando-nos aquele impulso que às vezes precisamos para seguir em frente depois de uma fase menos positiva da nossa existência. Orquestralmente rico e intenso, exemplarmente burilado, com o piano a estar sempre omnipresente em quase todas as dez músicas do registo, mas também repleto de inebriantes e efusivos arranjos de cordas, sopros e percussivos, Wild God é um exemplar exercício de luxúria sonora, um contundente tratado sonoro no modo como transpira uma farta espiritualidade, que atinge neste caso uma dimensão inédita, devido a uma profundidade que comove, instiga, questiona, e quase esclarece, porque contamina e alastra-se, tornando-se compreensível por todos aqueles que testemunham e sentem na pele tudo o que é aqui descrito, com ímpar grau de realismo. Disco belo no modo como parece apaziguar o inapaziguável, mas também na forma como inquieta e recria aquela sensação de desespero comum e contínuo que nos assola a todos, enquanto nos oferece um indisfarçável sentido de esperança, Wild God contamina-nos com o bem e faz-nos ter a certeza que nada é irremediável e que o amanhã pode ser sempre um feliz recomeço.
Não é qualquer banda que chega ao terceiro registo de originais já com a fama de ser um projeto influenciador e fundamental do universo sonoro em que se movimenta. Como é óbvio, nos The Smile, essa justa chancela deve uma enorme quota parte de responsabilidade à fama que os seus músicos grangearam nos projetos de onde provêm, mas a bitola qualitativa das suas propostas sonoras, já agora, avançando um pouco para o conteúdo de Cutouts e o grau de abrangência e ecletismo das mesmas é, neste caso em concreto, uma verdade indesmentível. Disco que mescla com mestria rock alternativo e eletrónica ambiental, verdadeiras traves mestras no adorno e na indução de cor e alma a um catálogo de canções de forte cariz intimista e que apenas revelam todos os seus segredos se a sua audição for dedicada, Cutouts agrega nas suas dez composições mais um fabuloso conteúdo sonoro, lírico e conceptual, que disserta com gula sobre cinismo, ironia, sarcasmo, têmpera, doçura, agrura, sonhos e esperança, ao mesmo tempo que catapulta os The Smile para um processo de criação cada vez mais livre de qualquer amarra ou constrangimento comercial, sem dúvida o modus operandi que mais seduz três músicos mestres a encarnar aquilo que o experimentalismo tem por génese: a mistura de coisas existentes, para a descoberta de outras novas.
1 - Father John Misty - Mahashmashana
Father John Misty é um dos artistas mais queridos deste espaço de crítica musical, sempre absorvido nos seus dilemas, vulnerabilidades e inquietações pessoais, enquanto ensaia, em cada novo trabalho, uma abordagem tremendamente empática e próxima connosco, sem se deslumbrar e perder a sua capacidade superior de criar canções assentes, quase sempre, num luminoso e harmonioso enlace entre cordas e teclas, que dão vida a temas carregados de ironia e de certo modo provocadores. Desta vez, o músico disserta sobre o momento civilizacional atual e a ténue fronteira que todos nós sabemos que existe entre e vida e a morte, considerando, o autor, que temos os nossos arraiais assentes em Mahashmashana, (महामशान) uma palavra em sânscrito que significa grande campo de cremação. E, de facto, este registo oscila entre canções com um intenso espírito roqueiro, viçoso, inquieto e irrequieto e baladas de elevado pendor melodramático e quase desesperante, sendo transversal a todo o registo uma permanentes sensação de tensão e de inquietude, que personifica, de certa forma, a tal fronteira ténue em que vivemos. É um disco, íntimo, profundo, reflexivo e repleto de laivos musicais de excelência que proporcionam ao ouvinte, entre muitas outras sensações que só a vivência da audição consegue descrever, uma constante sensação de beleza e de melancolia ímpares, enquanto testemunhamos o modo como Father John Misty concebe o mundo em que hoje vivemos e que, na sua opinião, está, comicamente, mais próximo do que muitos pensam da ruína.