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Benjamim - Auto Rádio

Segunda-feira, 21.09.15

Depois do Walter Benjamin, o Luis Nunes resolveu ser só Benjamim, escrever em português, montar arraiais na pacatez de Alvito, deixando Londres para trás e nessa linda vila alentejana montou um estúdio de gravação, por onde têm passado alguns músicos e projetos nacionais que têm merecido amplo destaque por cá, neste espaço de crítica e divulgação sonora.

Benjamim também abriu as hostilidades em relação à sua nova carreira a solo e Auto Rádio surge como o primeiro passo de um percurso cheio de anseios e expectativas e que até já resultou numa espécie de Volta a Portugal, materializada numa sequência de concertos de norte a sul do nosso país, durante trinta e três dias seguidos e que, nas palavras do próprio Benjamim, foi a digressão mais extensa e intensa que já aconteceu em Portugal, tendo passado por festas populares, associações culturais, festivais, bares, esplanadas, no meio da rua, num castelo, coretos e tabernas onde Benjamin tocou para todos os tipos de público que se pode encontrar. Gonçalo Pôla, amigo do músico, encarregou-se do registo foto-videográfico desta empreitada e elaborou um diário de estrada, um documento visual e sonoro precioso, não só para a percepção mais nítida do conteúdo musical e conceptual de Auto Rádio, mas também como documento de estudo de uma outra realidade muitas vezes ignorada do universo dos concertos no nosso país e de como é possível conceber espectáculos de música nos locais mais inusitados.

Antes de olhar com algum cuidado para o alinhamento de Auto Rádio é interessante elucidar acerca das motivações e das fontes de inspiração de doze canções que misturam rock, folk e a indie pop de cariz mais experimental. De facto, Auto Rádio debruça-se sobre as memórias que Benjamim guarda de relatos que o seu pai fazia do tempo que passou em Angola, de onde veio após a revolução dos cravos e, mais recenteemnte, de algumas histórias que Quinito, um amigo alentejano de Benjamim, lhe confidenciou, dos tempos que passou na Guiné, onde esteve destacado como militar no tempo da guerra colonial. Depois, a crise, relatos sobre a Invicta de onde a mãe é natural, o amor e carros a acelerar pela marginal de uma qualquer cidade são também ideias expostas com enorme bom gosto, uma ímpar sensibilidade e um intenso charme que parecem não se importar de transmitir uma óbvia sensação de despreocupação, algo que espalha um inconfundivel sentimento de qualidade, ainda maior pela peça em si que este disco representa, principalmente para o autor.

Benjamim confessa que as suas influências vão do Duo Ouro Negro à Lena d'Água, passando pelos Beatles, os Beach Boys e Bob Dylan. Influências à parte, confesso que o que mais me agradou na audição de Auto Rádio foi uma certa bipolaridade entre a riqueza dos arranjos e a subtileza com que eles surgiam nas músicas, muito de forma quase impercetível, conferindo à sonoridade geral do disco uma sensação, quanto a mim, enganadoramente, minimal. Na verdade, temas como Eu Quero Ser o Que Tu Quiseres e Do Céu e da Terra, estão cobertas por uma aúrea de sensibilidade e fragilidade romântica indisfarçáveis e depois, o bom gosto dos arranjos de cordas de O Quinito foi para a Guiné e a criatividade ímpar de Metereologia, explicam-se devido aqueles simples detalhes que, muitas vezes com uma toada lo fi, fazem toda a diferença no cariz que a canção toma e nas sensações que transmite.

Disco extraordinariamente jovial, que seduz pela forma genuína e simples como retrata eventos e relacionamentos de um quotidiano rotineiro, Auto Rádio está imbuído de uma enorme beleza melódica e estilística. É um documento que se escuta com enorme fluidez, onde existe um encadeamento claro entre os vários temas e uma noção de sequencialidade única, mesmo aqueles que parecem opostos no conceito e na ideia que procuram aflorar. Variado, portanto, nas temáticas que aborda, leva-nos à mesma, num abrir e fechar de olhos, do nostálgico ao glorioso, numa espécie de indie-folk-surf-suburbano, feito por um dos mestres nacionais de um estilo sonoro com nuances e características muito particulares. Confere a entrevista que Benjamim concedeu a Man On The Moon e espero que aprecies a sugestão...

Eu Quero Ser O Que Tu Quiseres

Tarrafal

Sintoniza

Os Teus Passos

O Quinito Foi Para A Guiné

O Sangue

Meteorologia

Volkswagen

Rosie

Do Céu E Da Terra

Auto Rádio

O Exílio

Depois do Walter Benjamin, o Luis Nunes resolveu ser só Benjamim, escrever em português, montar arraiais na pacatez de Alvito, deixando Londres para trás e nessa linda vila alentejana montar um estúdio de gravação, por onde têm passado alguns músicos e projetos nacionais que também tenho destacado no meu blogue e que falam sempre muito bem do tempo que passaram aí contigo. Agora, com uma banda, chegou a vez de olhares para a tua própria carreira e Auto Rádio surge como o primeiro passo de um percurso para o qual já criaste algum tipo de anseios e expetativas?

O primeiro passo surgiu em Dezembro com a morte do Walter Benjamin. Tinha de me libertar das amarras de um projecto que tinha há muito tempo e que, com o tempo, foi deixando progressivamente de fazer sentido, principalmente nesta fase em que voltei a morar em Portugal. As expectativas eram muitas mas mais no sentido dos desafios que toda esta mudança iria despertar, do que em termos de recompensa.

Antes de olharmos para o conteúdo de Auto Rádio deixa-me perguntar-te… Porque resolveste fazer uma espécie de Volta a Portugal, materializada numa sequência de concertos de norte a sul do nosso país, durante trinta e três dias seguidos?

Por muitas razões. Em primeiro lugar queria levar a música às pessoas, aproveitando agora o facto da mensagem das canções ser muito mais directa por causa da proximidade da língua, em segundo lugar queria aprender a cantar estas canções e habituar-me à mudança de língua, queria ser confrontado com todos os meus medos de frente – mudar de inglês para português é bem mais difícil do que parece. Por último, queria fazer algo que nunca tivesse sido feito e poder começar esta nova fase da minha vida com força e perceber como é que as pessoas reagiam às canções, independentemente do contexto. Ainda não conheci ninguém que se lembre de uma tour tão extensa e intensa em Portugal. Tocámos em festas populares, associações culturais, festivais, bares, esplanadas, no meio da rua, num castelo, coretos e tabernas para todos os tipos de público que se pode encontrar. Foi a viagem mais fixe que fiz com amigos – poder aliar a música a isso é um privilégio.

E como surgiu a ideia da presença do fotógrafo Gonçalo Pôla, que tem a cargo o registo foto-videográfico da empreitada e a elaboração de uma espécie de diário de estrada, que podemos acompanhar numa página da internet?

O Gonçalo é a pessoa que acompanhou este projecto mais de perto desde o início, foi a pessoa com quem mais desabafei acerca de todo este processo, algo que não foi mesmo nada fácil. Também foi ele que fez o vídeo de “Os teus passos” e foi juntos que começámos a imaginar a Volta a Portugal em Auto Rádio. Eu e o Gonçalo temos vários projectos sonhados que queremos concretizar, um deles é fazer um filme e isso tornou a presença dele absolutamente obrigatória nesta aventura toda.

Olhando então para o disco… De memórias remotas do Portugal colonial, que te chegaram aos ouvidos pelo teu pai, que regressou à metrópole em 1974 e por filmes super 8 que ele trouxe na bagagem, seja pelas histórias de um amigo teu alentejano chamado Quinito, que lutou na Guiné, ou as paisagens de Portugal, do Porto e até o amor, é imenso e intenso o ideário lírico e sonoro de Auto Rádio. É simples esta opção pouco ficcional e quase autobiográfica de escreveres sobre aquilo que te rodeia, em vez de inventares, na íntegra, histórias e personagens imaginárias, com as quais nunca terás à partida de te comprometer?

Eu gosto de inventar histórias aldrabando as minhas. Acho que nunca é simples escrever, seja sobre uma pessoa que conheces ou sobre o teu carro, mas eu acabo sempre por me comprometer com as personagens das minhas canções. Como é que alguma vez poderia agora vender o meu carro? Não dá, já está no coração.

Achei curiosas algumas das influências sonoras que referes, nomeadamente nas redes sociais, que vão do Duo Ouro Negro à Lena d'Água, passando pelos Beatles, os Beach Boys e Bob Dylan. Influências à parte, confesso que o que mais me agradou na audição de Auto Rádio foi uma certa bipolaridade entre a riqueza dos arranjos e a subtileza com que eles surgiam nas músicas, muito de forma quase impercetível, conferindo à sonoridade geral do disco uma sensação, quanto a mim, enganadoramente, minimal. Talvez esta minha perceção não tenha o menor sentido mas, em termos de ambiente sonoro, aquilo que idealizaste para o álbum inicialmente, correspondeu ao resultado final, ou houve alterações de fundo ao longo do processo?

Eu queria um disco absolutamente bipolar, isto sou eu a voltar ao zero, a reaprender a escrever canções e a experimentar com todos os sons que tinha à mão. Mudei a minha vida toda e construí o meu estúdio só para poder fazer isso. Claro que a cada dia que passou as coisas mudaram, essa é a parte mais entusiasmante de fazer um disco – é uma viagem em que o caminho nunca é muito claro, apesar de o destino já estar traçado pelas canções.

Além de ter apreciado a riqueza instrumental, o encadeamento e a sequencialidade entre as músicas e também a criatividade com que selecionaste os arranjos, gostei particularmente do cenário melódico destas tuas novas canções, que achei particularmente bonito. Em que te inspiraste para criar as melodias?

Acho que me deixei ir, quis fazer canções pop que é o que gosto de fazer. Inspirei-me em milhares de coisas diferentes, desde histórias a discos que ouço. Acho que a história acaba por influenciar  as melodias, a música tem que bater certo com o que dizes senão ninguém acredita.

Auto Rádio foi produzido por ti. Esta opção acabou por surgir com naturalidade ou já estava pensada desde o início e foi desde sempre uma imposição tua? E porque a tomaste?

Bem, eu sou produtor de outros discos e produzir é uma coisa que eu adoro fazer, apesar de nem sempre ser fácil estar a cantar e a produzir o mesmo disco. Mas este foi um disco mesmo difícil de deitar para fora, houve muita resistência à mudança por parte das pessoas que normalmente acompanhavam o Walter e as ideias que andavam na minha cabeça tinham que ser executadas exactamente de acordo com aquilo que eu imaginava. Para isso tive de tomar as rédeas do projecto com pulso de ferro e muita determinação, a certa altura deixei de mostrar as canções e comecei a ignorar por completo as opiniões de quase toda a gente. Senti que se caso eu fosse contra uma parede, então seria de acordo com as minhas convicções claras, sem pedir a culpa emprestada. Isso também era fundamental para o início desta fase, queria lançar uma semente que era minha para no futuro poder construir a partir daí. Dito isto, tive toda a ajuda de toda a gente, mesmo dos mais cépticos. É absolutamente normal um processo deste tipo gerar controvérsia e só assim é que é fundamental criar. O António Vasconcelos Dias, que toca comigo, foi um braço direito fundamental no que toca à produção, não só pela ajuda mas como por ter acreditado e dado uma força enorme. Bem como o Gonçalo e o Nuno Lucas. O Joca (João Correia, bateria) estava mais desconfiado e é por isso que eu o adoro, obrigou-me a provar-me a mim próprio o tempo todo. Ele é um músico do outro mundo e a opinião dele não dá para ignorar, ainda para mais é como um irmão e é absolutamente sincero com tudo.

Confesso que fiquei particularmente surpreso com a simplicidade do artwork de Auto Rádio, que, pelos vistos, mostra o Volkswagen referido no oitavo tema do disco. Como surgiu a ideia e a oportunidade de contar com o João Paulo Feliciano, da Pacata Discos na conceção do artwork?

Bem, o João Paulo é o líder da Pataca Discos e se alguém percebe de artwork é ele. Portanto a ideia e a oportunidade eram as coisas mais naturais do mundo. Havia outra ideia para capa que foi discutida com alguma paixão mas que ficou pelo caminho. Confesso que gosto de estar numa editora em que se discute porque as coisas são feitas com sangue, todos nós damos tudo para que as coisas fiquem de acordo com o que acreditamos. É uma editora de carolas e isso vale tudo no mundo, é cinematográfico. O João Paulo é um grande amigo há muitos anos e é uma honra poder tê-lo como editor e poder contar com a mão dele para o artwork. Como não?

Por falar em Pacata Discos, esta editora é a casa de alguns dos nomes fundamentais do universo sonoro musical nacional. É importante para ti pertencer a esta família que vai do jazz, ao fado, passando pela pop, o indie rock e a eletrónica?

Claro. Somos uma família bem alargada. Eu adoro poder ter amigos e colegas tão talentosos com quem tanto aprendo e que têm sempre disponibilidade em ajudar com o seu talento infinito. Isto para além de que estares num catálogo forte é importante e sinto que foi algo que fomos construindo juntos.

Adoro a canção O Quinito Foi Para A Guiné. Aliás, quando estiveres novamente com ele por aí, conta-lhe que o autor deste blogue lhe agradece particularmente pelo modo como te inspirou nesta música. E tu, tens um tema preferido em Auto Rádio?

Vou dizer-lhe, ele vai ficar vaidoso. Vai mudando mas durante muito tempo foi a Volkswagen. É um bocado como escolher o filho preferido, é difícil e ainda não tenho distância suficiente.

Para terminar, o que te move é apenas esta espécie de mistura entre rock, folk e a indie pop experimental, ou gostarias ainda de experimentar outras sonoridades? Em suma, o que podemos esperar do futuro discográfico do Benjamim?

Eu gosto de não ter preconceitos em relação à música. Durante muito tempo fui posto na prateleira da folk por causa de um disco do Walter Benjamin e se há coisa que eu pretendo é fazer uma quantidade enorme de discos diferentes. Eu quero experimentar tudo.

Obrigado pela entrevista e, principalmente, pela tua música!

Obrigado eu! Um abraço!

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publicado por stipe07 às 18:10






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